Chama-se “Expressão do Olhar, Olhar de Expressão” e é uma mostra de artes plásticas (pintura e fotografia), do criador moçambicano Francisco Vilanculo. As obras patentes no Centro Cultural Português, Instituto Camões, transformaram aquele espaço numa “basílica” de lágrimas, desespero, revolta e de esperança da mulher vítima de todo o tipo de opressão.
“Quem nunca, na insatisfação, se viu obrigado a usar a expressão facial, sem proferir qualquer palavra, para protestar? Quem nunca sofreu calado?”. É com base nessas questões e experiências humanas comuns que Francisco Vilanculo argumenta as razões do mote “Expressão do Olhar, Olhar de Expressão”, para a sua mostra de artes plásticas.
Segundo o pintor, “com estas obras pretendo mostrar o que as mulheres têm como forma de expressão, aquando da sua insatisfação e falta de palavra na sociedade moçambicana. Como sempre são exploradas, insultadas, abusadas sexualmente – traindo-se a sua confiança – a expressão facial é a sua arma secreta e confiável para gritar e/ou chorar”.
O curador da exposição e director da Escola Nacional de Artes Visuais, Jorge Dias, considera que “Francisco Vilanculo se apoia na fotografia, porque só com o retrato é possível captar o momento mais nobre de qualquer pessoa e, a partir de um vasto leque de opções, escolher as imagens que transportam, em si, a feminilidade, a simplicidade e a culturalidade, mas também a pureza e a força de cada um de nós”.
Vilanculo acredita que, independentemente da expressão que usamos para clamar, a linguagem que se emprega nos sentimentos é universal e é utilizada pela humanidade. Reconhecendo as diferenças subtis existentes entre a forma de manifestação do mesmo sentimento no seio de pessoas de culturas diferentes, o artista reafirma que o grito silencioso das mulheres carrega uma marca indelével perante a qual é difícil ser-se indiferente.
Segundo o artista, a exposição do sofrimento, da esperança e da angústia das mulheres constitui uma experiência única que se explica do modo seguinte: “Talvez eu tenha uma alma feminina, pois consigo ver e sentir a opressão de que as mulheres são vítimas. Nós, as pessoas, somos quem transforma a sociedade num ciclo de machismo. Educamos os nossos filhos a obedecer aos homens numa visão machista que só contribui para escravizar as mulheres”.
É dentro desse contexto que se explica a “Expressão do Olhar, Olhar de Expressão”, que além da tristeza, dor, do sofrimento, expõe a beleza mística das mulheres moçambicanas com expressões fortes que nos transmitem mensagens particulares. Essas mulheres – makuas, mandaus, makondes, marongas, por exemplo – possuem, na visão da mostra, um destino dessacralizado.
Está-se diante de uma espécie de “escravidão de género”. Nesse sentido, essa sujeição aflige as mulheres com enfoque para as mais vulneráveis – crianças e idosas. Independentemente das razões que estimulam atitudes machistas e opressoras, segundo Vilanculo, o importante é reflectir nas seguintes questões: “O que será de uma criança e/ou idosa violentada sexualmente? Que qualidade de vida possui uma esposa espancada diariamente?”
Para vincar o desamparo, a exclusão social e a injustiça de que as mulheres são vítimas, o artista plástico incluiu na sua mostra a obra “Caminhos da feiticeira” que ilustra mulheres maltratadas supostamente por serem feiticeiras. Naquele trabalho, o artista mostra essa mulher que ao longo da vida se dedicou para que pudesse garantir a educação dos filhos, realizando trabalhos duros, e, numa altura em que espera receber alguma “recompensa”, simplesmente, é rejeitada pelos seus familiares.
“Há pessoas que pensam que os seus próprios progenitores são bruxos. Por essa razão, por mais que seja doloroso para mim e para muitos, com esta exposição de arte quero mostrar essa imagem que alguns têm de mulheres que, ao longo dos anos, deram tudo pelas suas vidas. A nossa mulher, principalmente a idosa, é considerada ‘cobra’. Por isso, coloquei-a sem membros para ilustrar até que ponto tal atitude gera uma imagem degradante externa e internamente”, refere. A mostra “Expressão do Olhar, Olhar de Expressão” estará patente no Centro Cultural Português, Instituto Camões, até o dia 28 de Junho.