As leis que entre Maio e Junho deste ano causaram sérios alaridos por serem consideradas o “cúmulo do abuso do poder, falta de respeito e consideração, mau uso dos recursos do povo”, entre outras qualificações, e que foram devolvidas à Assembleia da República pelo Chefe de Estado, Armando Guebuza, para reexame, foram aprovadas. Deverão, novamente, ser submetidas ao mais alto magistrado da Nação para efeitos de promulgação.
Trata-se da Lei da Revisão da Lei do Estatuto, Segurança e Previdência do Deputado, designada Estatuto do Deputado, e da Lei da Revisão da Lei 21/92, de 31 de Dezembro, que estabelece os Direitos e Deveres do Presidente da República em Exercício e após a Cessação de Funções, que foram reanalisadas e aprovadas com recurso à ditadura da maioria absoluta da Frelimo, que ao longo da presente legislatura sufocou a oposição no Parlamento.
Armando Guebuza devolvera os dois dispositivos para reexame por entender que deviam merecer uma reapreciação pela Assembleia da República, “atendendo especialmente ao impacto socioeconómico que possam causar e às dificuldades em implementá-las em termos financeiros e orçamentais”.
Vai, agora, Guebuza, promulgar tais leis? Todavia, os nossos deputados, que já auferem por ano o que um trabalhador do sector agrícola, por exemplo, ganha em 30 anos e têm direito a tantos outras benesses, não se coibiram de aprovar tais leis que fixam outras mordomias, que até certo ponto são promíscuas num país onde o povo ainda se queixa de problemas básicos, tais como transporte, saúde e educação com qualidade.
Este desrespeito pelo interesse público levar-nos-á ao caos, um dia! A Assembleia da República é soberana, mas algumas decisões, que deviam ser tomadas em nome do povo, denunciam uma tamanha preocupação com a aparência e acomodação dos deputados, bem como o desejo de encher as panças de outra gente, pese embora tenha funções directivas no país.
Aliás, com a aprovação do Estatuto de Líder de Oposição (o segundo candidato mais votado ao cargo de Presidente da República), o Orçamento do Estado vai sofrer um encargo adicional de pouco mais de 71 milhões de meticais anualmente para garantir uma residência oficial ao visado, gabinete de trabalho, meios de transporte, ajudas de custo, entre outras despesas, para além da prerrogativa de o tal líder da oposição estipular o seu próprio salário e subsídios. Que prova mais cabal se pode exigir de que o país tem dinheiro a rodos, mas não para assegurar uma vida digna ao povo?
A competência política, legislativa e de fiscalização do nosso Parlamento está em causa, pois deixa-se avassalar pela apetência de meter a mão nos cofres do Estado com o intuito de cimentar ainda mais as desigualdades sociais entre os governantes e os governados. Acabou a era de austeridade que o Governo apregoava há poucos anos? Afinal só não existe dinheiro para os profissionais da Saúde, professores, agentes da Polícia, por exemplo, mas há para os deputados, Chefes de Estado fora do activo e para o líder de oposição com assento no Parlamento?