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O Cinema africano retorna a Moçambique...

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Na noite de quinta-feira, 11 de Abril, no Teatro Avenida, a cidade de Maputo acolhe o início da Primeira Semana de Cinema Africano. “Há mais de 20/25 anos que os moçambicanos não assistem ao cinema africano”, comenta o director do festival, João Ribeiro, acrescentando que “esta é uma oportunidade única para ‘se ver’ as histórias africanas”. Na área da ficção, a nova longametragem de Licínio Azevedo, Virgem Margarida, é o filme de estreia.

 

Agindo contra uma estrutura sociopolítica e económica que pouco favorece a realização de eventos desta natureza, no país, uma equipa de vários actores da área cultural (constituída por João Ribeiro, Üte Fendler, Diana Manhiça, Magda Burity, Mickey Fonseca, Miguel Prista, Quito Tembe e Iva Portugal) decidiu realizar, entre os dias 11 e 18 de Abril, a Primeira Semana de Cinema Africano de Maputo.

 

A iniciativa, que cruza documentários de ficção (em diversos géneros) de realizadores oriundos de países de África – como, por exemplo, África do Sul, Burkina Faso, Camarões, Congo, Costa de Marfim, Mali, Mauritânia, Moçambique, Senegal e Zimbabwe – tem em vista fazer com que estes sejam distribuídos em algumas salas alternativas para a sua exibição.

Com a excepção do filme a ser visto no dia 11, Virgem Margarida, – reservado a convidados – todos os outros terão poderão ser visionados de forma gratuita, em salas como: o Teatro Avenida, o Auditório da Televisão Independente de Moçambique (TIM), o Instituto Nacional do Cinema e Audiovisual (INAC), o Auditório do Centro Cultural Franco-Moçambicano (CCFM), incluindo o Auditório da Faculdade de Letras e Ciências Sociais da Universidade Eduardo Mondlane (FLCS/UEM).

Um festival que se impõe como um argumento

Além do facto de o acesso aos espaços em que a Primeira Semana de Cinema Africano de Maputo terá lugar ser gratuito, os organizadores da iniciativa não poupam esforços para revelarem outros argumentos da importância da realização.

“A última mostra do cinema africano feita com uma grande dimensão, na área de longa-metragem de ficção, aconteceu há mais de 20/25 anos em Moçambique”, começa por dizer João Ribeiro, o director da iniciativa.

O outro aspecto é que os filmes seleccionados por Üte Fendler – da Universidade de Bayruthu, na Alemanha, na qualidade de curadora do festival – para a mostra, incluem vários géneros cinematográficos. Há comédias, thrillers políticos, drama psicológico e filosófico, terror, romances e ficção científica. No entanto, refira-se, a diferença não é só esta abundância de tipos de filmes.

A alternatividade da Primeira Semana de Cinema Africano de Maputo tem a ver com a origem dessa produção cinematográfica, incluindo os conteúdos desenvolvidos.

Ou seja, “notamos que uma coisa é fazer um filme de amor, ou uma comédia, mas outra é realizar o mesmo nos géneros referidos, no contexto africano. A partir daí, as temáticas, os símbolos e a nossa relação com os mesmos tornam-se diferentes. É aí onde se encontra uma alternativa para o consumo destes produtos cinematográficos – porque este tipo de obras não é oferecido nas salas de cinema comercial/convencional”, explica Ribeiro.

Para João Ribeiro, o realizador de O Último Voo do Flamingo, “o nosso quotidiano, em Maputo – onde as salas de cinema convencional são muito poucas e, invariavelmente, projectando filmes que lhes dão algum retorno financeiro – é ilustrativo para se perceber a relevância de iniciativas como a Semana de Cinema Africano de Maputo”. Ou seja, “trata-se de um evento que permite a atracção de alguma atenção da Imprensa e daqueles que podem mudar algo na legislação cinematográfica nacional”.

Uma reclamação oportuna

Se é verdade que a Primeira Semana de Cinema Africano de Maputo foi criada para que haja a projecção do cinema no país, para que os filmes sejam vistos, não é menos verdade que (na mesma proporção) se geram oportunidades de diálogo e discussão em volta dessa produção cinematográfica, dos problemas, das dificuldades, dos desafios e oportunidades que daí surgem.

Por isso, nesse campo, João Ribeiro lamenta o facto de que “não há, em Moçambique, nenhuma lei para a área do Cinema, da Rádio e da Televisão. O que há é uma norma antiquíssima criada um pouco depois da independência nacional – por isso já desajustada da realidade actual, mas que regula todas as três áreas”.

Então, essa “realidade precisa de ser revista. Só a partir da criação destes espaços – que geram alguma discussão – é que se pode falar para que alguém nos possa ouvir. Sem iniciativas concretas, todos falamos mas não chegamos a lado nenhum porque não temos a atenção das pessoas que fazem a Imprensa e das que a consomem”.

Virgem Margarida

Referindo-se à Virgem Margarida, obra a que o estimado leitor terá a oportunidade de assistir – no âmbito da Primeira Semana de Cinema Africano de Maputo – o conceituado realizador moçambicano, Licínio Azevedo, que outrora realizou O Tempo dos Leopardos, explica:

“Uma vez, o Ricardo Rangel mostrou-me uma fotografia, tirada no pós-independência, de uma prostituta a ser escoltada por dois militares. Inspirado por essa imagem, eu fiz um documentário, muito clássico, com entrevistas a mulheres, prostitutas e militares, que estiveram nesses centros de reeducação. Foi durante essa entrevistas que muitas me falaram da Margarida, uma camponesa adolescente, que estando no lufar errado à hora errada acabou por morrer tragicamente. Como se tratava de uma história de alguém que já não está vivo, decidi fazer uma ficção”.

Durante 2012, o filme foi rodado nalguns festivais de cinema na Europa e na América, onde foi favoravelmente criticado. Até então, Virgem Margarida foi nomeado em sete categorias pela Africa Academy Movie Awards de 2013, na Nigéria. No entanto, apesar dos anteriores feedbacks positivos recebidos pelo realizador, tais nomeações não deixam de constituir uma surpresa. Mas “agora, mais do que a análise do júri, o mais importante para mim é que o filme seja visto por mais gente”, afirma Licínio Azevedo.

Na verdade, Virgem Margarida é uma tragédia humana – totalmente ficcional – que se baseia em factos reais. Na explicação do realizador, “está-se diante de uma história que poderia ter acontecido em qualquer outro país do mundo, em determinado período histórico. Mas ela é inspirada em personagens moçambicanas, em factos que ocorreram no país e, ainda que o filme seja de uma co-produção internacional, Moçambique possui um peso muito maior. Todos os actores são locais e grande parte da equipa técnica também”.

Um ponto de encontro

Durante a Primeira Semana de Cinema Africano de Maputo, todas as noites, o Modaskavalu – um espaço anexo ao Teatro Avenida – irá acolher eventos de música e muita diversão. É aí onde começa a materialização do papel do promotor de eventos culturais, Quito Tembe, que se associa ao festival.

Segundo o nosso interlocutor, saiba que “a minha missão é desenvolver um programa de eventos paralelos à Semana de Cinema. Uma das ofertas que eu sinto que tem faltado em muitos festivais culturais, não só em Moçambique, são os pontos de encontro”. Por isso, “eu envolvo-me nesta iniciativa com a tarefa de criar um ponto de encontro, em que realizadores, jornalistas, amantes do cinema, incluindo outros públicos, se possam encontrar a fim de interagir e trocar experiências num espaço que não será, necessariamente, a sala de cinema”.

Quito Tembe explica que “iremos criar um programa de animação que irá acrescentar valor à Primeira Semana de Cinema Africano de Maputo, através de outras expressões de arte com enfoque para a música, a dança e outras composições artísticas que irão acontecer em seguida às projecções dos filmes no Teatro Avenida”.

A primeira iniciativa será a realização de uma mostra fotográfica do fotojornalista moçambicano Funcho, no Teatro Avenida. Ainda no âmbito da Semana do Cinema Africano, serão realizadas exibições dirigidas a estudantes – com a presença da curadora do festival Üte Fendler e do professor Miguel Prista – na Faculdades de Letras e Ciências Sociais da Universidade Eduardo Mondlane.


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