Está instalado o braço-de-ferro no futebol feminino moçambicano. A notícia que dá conta de que Moçambique não irá participar nas provas internacionais até Julho de 2015 não foi bem recebida pelos atletas desta modalidade, que acusam o Federação Moçambicana de Futebol (FMF) de lhes ter faltado ao respeito.
As jogadoras da selecção feminina de sub-20 procuraram o @Verdade, nesta semana, para responder a uma suposta entrevista concedida por Faizal Sidat, presidente da Federação Moçambicana de Futebol (FMF), a um órgão de informação público, na qual comunica o “banimento do futebol feminino em Moçambique”. Falando na condição do anonimato por temerem represálias, as atletas dizem que se sentiram insultadas por aquele dirigente que supostamente lhes apelidou de “mamanas” ao perderem por 15 a 1 diante da Tanzânia na fase de apuramento para o Campeonato Africano da modalidade.
Para elas, a culpa pelo desaire diante da selecção tanzaniana não pode ser imputada às atletas, conforme terá acusado Faizal Sidat. “Treinámos apenas quatro dias. Algumas jogadoras das outras províncias do país e muito amigas do treinador só se juntaram ao grupo no último dia antes do embate da primeira ‘mão’ e mesmo assim foram titulares. E se queriam milagres, então esqueceram- se de nos dar asas”, disse uma das entrevistadas.
“Nós entrámos nesta eliminatória cientes de que íamos encarar um adversário que se preparava há sensivelmente seis meses. Nós tivemos uma preparação de apenas quatro dias. Era inevitável perder da forma como perdemos”, acrescentou outra jogadora, também na condição de anonimato. Ainda assim, as atletas da selecção feminina de sub-20 acusam, igualmente, as rivais tanzanianas de terem recorrido a actos de feitiçaria para ganharem os jogos, o que evidencia a incoerência existente no seio do grupo sobre o verdadeiro motivo do descalabro.
“Antes do arranque da partida, as jogadoras da Tanzânia vieram até ao nosso balneário oferecer pulseiras que devíamos usar durante o jogo, em nome da amizade. Só que, estranhamente, não conseguíamos correr e nem tocar na bola devidamente. Sentimos que houve uma força sobrenatural que nos impediu de mostrar o mínimo que sabemos fazer”, revelou umas das jogadoras que acrescentou que a capitã da selecção nacional, por exemplo, durante a partida de Dar es Salaam, em que perderam por 10 a 0, sentiu o corpo a doer e chegou a perder os sentidos.
“A nossa guarda-redes também se queixou. Não conseguia ver a bola. Dizia sempre que tinha um pano preto que lhe vendava os olhos e por isso sofreu golos infantis”, disseram as nossas entrevistadas. No que ao jogo da segunda “mão” diz respeito, em que a derrota não foi tão desastroso como o da primeira “mão”, em que perderam por 5 a 1, as moçambicanas acusam Aquimo Rachide de ser o maior responsável pelo facto de ter operado mudanças que, na óptica delas, foram estranhas. “Não entendemos o que se passou na cabeça do mister. Obrigou-nos a mudar de posições no decurso do jogo. Uma avançada podia ser chamada para defender. Foi por isso que a equipa adversária marcou três golos logo na primeira parte”, explicaram.
“O presidente da FMF ofendeu-nos”
Depois da humilhação, as jogadoras da selecção nacional sub-20 ficaram surpreendidas com a decisão da Federação Moçambicana de Futebol de suspender a participação de Moçambique nas provas internacionais durante um ano e meio. Para elas, o organismo do “Fonte Azul” está a cometer um erro de dimensão “oceânica”.
“Enquanto nós estivermos paradas, sem fazer nada, as outras selecções estarão a trabalhar para serem ainda mais fortes. Quando regressarmos não estaremos à altura de competir de igual para igual. Eram importantes estes jogos internacionais para ganhar mais experiência”, alertam. Ainda assim, entendem que a federação devia ter mão dura relativamente a “colegas que se comportam mal. Bebem e fumam durante o período de trabalho”.
“O futebol feminino em Moçambique nunca teve valor. Hoje a federação comporta- se assim porque está habituada a colher resultados imediatos. Se tivéssemos derrotado a Tanzânia seríamos heroínas. Não temos uma competição interna de alto rendimento e o que temos não passa de um campeonato para enganar os que patrocinam esta modalidade em Moçambique. Porque não podem banir, por exemplo, o futebol masculino que sempre deu dissabores aos moçambicanos?”, contestaram.
Ao ataque, as atletas da selecção sub-20 lamentaram o comentário supostamente feito pelo presidente da FMF num jornal, em que lhes qualificava de “’mamanas’ que não sabem jogar futebol”. “Estamos há mais de cinco anos a jogar pela selecção nacional, apesar da nossa idade. Já representámos várias vezes o país nas provas internacionais. Só hoje ele conseguiu ver que somos ‘mamanas’? Se calhar ele não estava consciente quando proferiu tal insulto. Faltou-nos ao respeito”, concluíram.
“Nunca chamei ‘mamanas’ às jogadoras”, Faizal Sidat.
O presidente da Federação Moçambicana de Futebol (FMF) disse ao @Verdade que nunca proferiu palavras insultuosas contra as atletas da selecção feminina de sub-20. “Nem contra elas, nem contra ninguém. Sou uma pessoa de princípios e chefe de família. Não é verdade que eu tenha dito isso”.
Sidat esclareceu que “houve deturpação da entrevista que concedi a um órgão de informação. Mas ainda nesta semana, o mesmo jornal virá publicamente retratar-se, pois senti que a minha imagem foi maculada. Tudo será devidamente esclarecido e não quero alimentar polémicas com isso”.
O dirigente federativo avançou ainda que o seu organismo não vai banir o futebol feminino em Moçambique mas que, pelo contrário, “queremos que haja melhor organização interna desta modalidade. Foi por isso que decidimos que não vamos nos inscrever nas provas internacionais durante o ano de 2014 até Julho de 2015”.
Durante este período, afirmou Sidat, “vamos potenciar o futebol feminino com a adopção de campeonatos provinciais, regionais e nacionais. Queremos que cada província tenha a sua própria selecção para competir numa prova regional. Vamos dar total apoio à Liga Nacional de Futebol Feminino (LNFF), um organismo autónomo, para que possa desenvolver, vivamente, as suas actividades a partir do próximo ano. Estivemos reunidos nesta quinta-feira (05) e conversámos muito sobre isso”, acrescentou.
Faizal Sidat explicou, em linhas gerais, que os clubes e as províncias devem organizar-se porque o próximo ano será dedicado inteiramente ao futebol feminino e que, para além da organização do Campeonato Nacional pela LNFF, haverá competições provinciais e regionais, uma forma encontrada para a massificação desta modalidade desportiva em Moçambique.
“As selecções não vão deixar de existir. Só que não irão competir nas provas internacionais como acontecia. Mas haverá jogos amigáveis e de rodagem com alguns países vizinhos. O que precisamos, neste momento, é de organizar a casa e temos 18 meses para o fazer. Em Julho de 2015 vamos participar nas eliminatórias que dão acesso ao Campeonato Africano de Futebol Feminino”, concluiu.