Há um riacho que divide e une o município de Inhambane ao distrito de Jangamo. Vem de um lugar estranho e percorre, serpenteando, uma longa distância até desaguar no mar. Não é de grandes proporções, como nunca foram de grandes dimensões todos os riachos. Mas ele toma lugar especial porque nunca seca. Nunca secou. E não se conhecem relatos de transbordos que tenham causado estragos. É um mito. Que se agiganta por ser esta a fonte “insignificante” que fornece água a toda a autarquia, desde os tempos seculares. Sem limites.
A Reportagem do @Verdade decidiu ir até lá, mas não chegou ao destino. Estivemos perto disso, porém, a inacessibilidade do lugar não nos deixou avançar mais do que havíamos conseguido. Queríamos chegar até onde brota o líquido indispensável à vida, ou seja, à fonte de um rio que não se importa com a chuva, nem com a seca. Mas as pessoas da zona, que nos podiam ajudar, também nunca viram esse sítio. De acordo com João Nguila, “não é fácil o senhor chegar até lá. Nós também aqui nunca vimos a tal fonte. O que fica à vista é um lugar onde a água se acumula, vinda de uma parte incerta e se transforma neste riacho que se vê aqui. Mas a verdadeira fonte nunca vi”.
Do centro da cidade para a principal estação de tratamento controlada pelo Fundo de Investimento e Património do Abastecimento de Água (FIPAG), são pouco mais de dez quilómetros, e daqui para onde tudo começa são cerca de três. E nesse percurso o que se pode ver é quase um fiapo, que se vai abrindo aqui e ali, sem qualquer significância aparente. Outro aspecto é que, aquelas águas preguiçosas parecem estagnadas, mas correm, em direcção ao mar, e as que não podem continuar na sua viagem são retidas na estação de tratamento. E para chagarmos à fonte, tínhamos de ir em direcção contrária ao riacho, perguntando aqui e ali, onde é que fica a nascente.
“Senhor, é difícil chegar até lá, porque nós também nunca fomos. Não sabemos onde nasce este rio. É muito longe”. Ninguém parecia disposto a levar-nos ao fulcro. Os próprios trabalhadores do FIPAG, cuja vocação é tratar e distribuir o precioso líquido, foram relutantes. “O que nós podemos fazer é levar o senhor até um sítio, mas que não é propriamente a fonte”. Na verdade, não é ali a fonte do rio, apesar da aparência. Quer dizer, vindo da estação de tratamento, chega-se a um ponto onde tudo termina ou começa.
O rio é interrompido por um banco de areia seca, por sobre o qual se pode passar em segurança, como se não houvesse água, nem vestígios. Parece ser a partir dali onde o riacho começa. Mas não. Estranhamente, as coisas não começam ali. As águas no local são letárgicas. Não parecem ser elas que irão, depois, caminhar desinteressadamente, até constituir-se num caudal de não acabar. “Só podemos chegar até esse lugar. Porque depois dali tudo é mato”. Aquilo que aos nossos olhos parecia simples é muito mais complexo.
Porque à história do rio Guiúa junta-se uma outra de um riacho que vem da zona de Barbozene e irmana- se com aquele, parecendo rios siameses. Para o nosso interlocutor, o mais estranho é que o caudal que vem de Barbozene tem um braço que desagua no mar, e outro braço que parece vir desaguar no Guiúa, criando uma confusão sobre a fonte que alimenta a autarquia de Inhambane. É impressionante que um rio venha desaguar perto da nascente de um outro rio, porque o Guiúa tem a sua própria fonte. Há pessoas que viram essa fonte, mas hoje, com a erosão e o aparecimento do arvoredo, não é fácil chegar-se até lá.
Foi uma deveras frustração não termos podido chegar à fonte do riacho que nos dá a água sem parar. E tivemos de nos contentar com a sua continuação. Fomos até onde a situação nos permitiu ver o fiapo dividindo a estrada. De um lado o município de Inhambane, e do outro, o distrito de Jangamo. É espantoso o que se pode constatar nas duas margens. As pessoas não se cansam de fazer machambas. Cultivam até muito perto do fio de água que corre lentamente sem parar em direcção ao mar, e mesmo assim as águas não secam. De cada vez que as usam para a irrigação natural, elas se renovam.
O que significa Guiúa?
O centro de Guiúa está instalado na missão da Igreja Católica de Inhambane. E o lugar não terá sido escolhido ao acaso, por tudo aquilo que ele representa. Possui uma paisagem arrebatadora e tem aquilo que nunca pode faltar na vida das pessoas: a água. Sempre tivemos na agenda esclarecer este nome. Saber que é que ele significa. João Tinga, um dos guias que fomos abordando no nosso trabalho, abriu-nos toda a luz. Guiúa quer dizer um lugar sem ninguém, mais ou menos virgem, nunca explorado. E será disso que os missionários se poderão ter apercebido, e ali se instalaram.