Depois da presença massiva, em Nampula, de povos oriundos de países como Burundi, Congo, Mali, Nigéria, Guiné e Senegal, nos últimos dois anos, a capital do norte tem recebido os Massai – um povo proveniente das regiões montanhosas do Quénia – confirmando-se, assim, a hospitalidade dos moçambicanos.
Os Massai, um povo oriundo de Quénia, têm sido uma presença notória na cidade de Nampula. Nos dias que correm, tem-se tornado comum, sempre que alguém se faz presente nas ruas e avenidas locais, testemunhar um movimento, diário, quase espectacular, do povo dos montes Kilimanjaro, no Quénia.
Os constituintes deste grupo étnico, de ambos os sexos, vestem-se de capulana. Sempre que se fazem às ruas de Nampula, os cidadãos locais ficam curiosos. É que suspeitam que eles, uma vez que são uma comunidade nómada, se tenham deslocado do Quénia a Moçambique a pé.
Neste sentido, recentemente, o @Verdade interpelou um dos Massai de nome Baraca que afirmou que vive com a sua família numa casa arrendada no populoso bairro de Muhala-belenses. No dia-a-dia, dedicam-se ao comércio de artigos artesanais como sandálias e bijutarias diversas, importados do Quénia, o seu país de origem, para onde, trimestralmente, se deslocam.
Entretanto, algumas cidadãs nampulenses que se interessam pelas tranças das Massai – uma actividade desenvolvida por aquela comunidade em moldes comerciais – chegam a pagar 500 meticais. Baraca afirma que a sua chega a Moçambique, a par dos seus familiares, foi obra do acaso. Em dois anos de um longo percurso, eles não tinham a noção do seu destino. O objectivo era chegar a um lugar onde podiam encontrar melhores condições de vida e um ambiente sossegado.
É como Baraca explica: “quando partimos de Quénia éramos um grupo de 15 pessoas. Não tínhamos um destino certo. Por isso, estávamos à procura de um país onde poderíamos dar continuidade às nossas actividades comerciais. Escalámos uma das províncias de Tanzânia, mas sentimos que não era onde pretendíamos permanecer. Decidimos dar continuidade ao percurso até que, através de Cabo Delgado, chegámos a Moçambique”.
Num outro desenvolvimento, Baraca considerou que a sua inserção social na província nortenha de Nampula não foi difícil, uma vez que o povo local fala o swahili, que é um idioma que lhes é familiar. Não obstante, aquele cidadão afirma ainda que “a nossa língua nativa chama-se maa, mas só a usamos quando estamos entre nós.
Com a ajuda de alguns vizinhos que falam swahili, aprendemos a língua portuguesa, embora com algumas dificuldades. Mesmo o modo de vida que levamos cá em Nampula é muito diferente, porque aqui estamos na cidade enquanto no Quénia – nos montes Kilimanjaro – vivemos num pequeno povoado distante do meio urbano. Estamos a adaptar-nos à cultura local. Ainda não tivemos a ideia de regressar à nossa terra natal. Aqui, em Nampula, sentimo-nos em casa também”.
Preservar a cultura
De acordo com Baraca, o ambiente urbano da cidade de Nampula tem limitado a sua tribo, no tocante à realização de alguns rituais e manifestações culturais. Práticas como algumas danças tradicionais e ritos de iniciação são exemplos de actos culturais que aquele povo, ainda que os queira preservar, não os pode realizar, ou se o faz é com certas restrições.
Para manter a sua cultura, sempre que chega a época de festivais, nas quais manifestações culturais de género têm lugar, os Massai elegem alguém para se deslocar ao Quénia a fim de representá-los.
Segundo o nosso interlocutor, o tipo de alimentação, o traje e as práticas religiosas são os únicos hábitos tradicionais que a comunidade Massai preserva não obstante estar em Nampula. Essencialmente, este povo alimenta-se de carne de cabrito ou de vaca e leite. Consome ainda xima e pão.
Baraca afirma que para não se ferirem alguns princípios culturais do povo nativo, o seu grupo encontra-se na cidade de Nampula com as respectivas esposas. Em relação às mulheres grávidas, quando chega a hora do parto, deslocam-se com alguma antecedência à terra natal, uma vez que na cultura e tradição Massai não se permite que o serviço de parto seja realizado nas maternidades modernas.
É a par disso que a nossa fonte esclarece: “a minha tia teve de se deslocar à casa para dar à luz, porque aqui ela não teria ajuda. Além disso, a criança seria rejeitada pelos nossos familiares no Quénia, porque, depois de a mulher dar à luz, ela passa por alguns rituais, sobretudo para se prevenir de determinadas doenças”.
Quando os Massai adoecem não se dirigem ao hospital. Eles tomam vários tipos de medicamentos tradicionais. É que “nós temos o nosso medicamento. Por isso, em nenhum momento nos dirigimos aos hospitais. Em casos graves, regressamos à casa para prosseguir com os tratamentos feitos por pessoas conhecedoras da área”, refere.
Nós nunca vamos à escola
Baraca afirma que a não escolarização é outra prática seguida pelos Massai, apesar de o Governo queniano trabalhar no sentido de expandir os serviços nacionais de ensino às comunidades recônditas daquele país.
“Nós nunca vamos à escola. Aprendemos o respeito pelo outro, a caça e a recolecção, a pastagem e a construção de cabanas, entre outras actividades. Somos impedidos de ir à escola, razão pela qual as mulheres casam-se muito cedo, aos 12 anos de idade. Aos rapazes é-lhes exigido que tenham uma quantidade razoável de cabeças de gado para que possam ofertar aos pais da noiva quando se casarem”.
Na verdade, os Massai substituem a formação pelo temor ou adoração a Deus. Professam a religião cristã católica, o que os move a ir, aos domingos, à missa em Nampula.
Com base num calendário tradicional, apesar de estarem num país diferente do seu, os Massai seguem os rituais do seu povo. Há, por isso, vezes em que, estando em Nampula, os homens rapam o cabelo e pintam-se de vermelho.
Baraca é proprietário de uma manada de bois que se encontra no Quénia, a sua terra natal, estimada em cerca de 50 cabeças. É por essa razão que se desloca, com alguma regularidade, para a sua aldeia naquele país.
Refira-se que, de acordo com Baraca, todos os Massai que estão em Nampula possuem passaportes, daí que a sua presença em Nampula não seja ilegal. Eles apresentaram- se nos Serviços Provinciais de Migração regularmente.