Moçambique é um Estado de Direito porque a Constituição da República assim o declara. Porém, efectivamente, este princípio não se verifica quando é examinado no contexto da Administração da Justiça. O país seria como tal se a igualdade dos cidadãos perante a lei fosse efectiva quando se trata de responsabilizar os agentes de infracções pelos órgãos de Justiça, tais como o Ministério Público, entidade através da qual o Estado exerce o direito de punir, ou se a sua ligação ao poder político não obstaculizasse a acção da justiça.
Segundo o Centro de Integridade Pública (CIP), na prática, em Moçambique a Justiça resvala sempre num alerta/queixa que tem sido emitido pelos diferentes segmentos sociais: “É forte para os fracos e fraca para os fortes e isto por culpa do quadro legal que enfraquece a autonomia legal do Ministério Público e a independência formal dos tribunais”.
Aquele organismo que actua na área boa governação, transparência e integridade, considera que um Estado de Direito que se pretende efectivo, para além do primado da lei que no seu seio deve reinar, deve possuir um sistema de administração da Justiça que ofereça garantias de que as violações dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos serão penalizadas pelo Judiciário, assim como deve ser penalizada a violação de bens jurídicos fundamentais da comunidade, independentemente do estatuto político ou condição social do agente da infracção ou infractor.
O CIP defende que a independência dos tribunais é beliscada pela sua adulação a outros poderes do Estado, sobretudo o político, facto que se constata pela forma como o titular do Tribunal Supremo é indicado para a sua função, o que “não o protege de possíveis influências e pressões, directas ou indirectas, dos demais órgãos de soberania, concretamente do Presidente da República”.
Outro aspecto tem a ver com a total falta de independência financeira do Supremo, o que pode condicionar bastante a sua actuação. Assim, a indicação do dirigente daquele tribunal pode ter a ver confiança política, “não obstante a impossibilidade legal de o Presidente da República demiti-lo, senão exonerá-lo findo o mandato constitucionalmente consagrado.
“Neste sentido, existe o risco real, senão efectivo, de tráfico de influências pelo Presidente da República para a protecção de interesses estranhos à boa administração da Justiça e ao interesse público. Impõe-se, assim, encontrar um mecanismo de indicação do presidente do Tribunal Supremo que afaste eventuais possibilidades de compromissos com a classe política do partido no poder, por via do Presidente da República, até porque os titulares mais altos dos cargos governativos e, por isso, de políticos, pelo seu estatuto devem ser julgados pelo Tribunal Supremo”.
De acordo com o CIP, na Justiça moçambicana, um dos factores que fazem com que se duvide da imparcialidade do Tribunal Supremo é o caso ligado ao juiz Luís Mondlane, pelos factos por ele cometidos quando era presidente do Conselho Constitucional, os quais a sociedade pretende ver esclarecidos. O visado efectuou gastos tidos como ilícitos, que obrigaram à sua renúncia do cargo de presidente daquele órgão. No decurso do processo instaurado para se apurar os factos, Luís Mondlane voltou para a 2ª Secção Criminal do Tribunal Supremo, onde, aliás, recentemente fora nomeado para exercer o cargo de presidente de secção.