No primeiro dia do Festival Encontrarte – que decorre em Maputo desde a semana passada – sublimou-se as danças tradicionais moçambicanas. Lá encontrámos Arlindo Chiterreto, um bailarino de 49 anos. Conheça-o nos próximos parágrafos...
Nasci em 1964 e a minha relação com a dança tradicional iniciou na infância, ao longo de 1970. Felizmente, cresci durante os tempos em que na sociedade moçambicana se disseminava o amor pelas actividades artístico-culturais. Eu escolhi praticar as danças.
Dediquei-me a esta modalidade artística durante toda a minha vida. Por exemplo, quando tinha 18 anos, em 1982, fui raptado para a tropa a fim de cumprir o serviço militar obrigatório. Lá tive a sorte de – no contexto dos treinamentos militares – também realizar as danças tradicionais com destaque para a Timbila e a Ngalanga.
No fim da formação militar, porque sou originário do distrito de Inharrime, vim para a cidade de Maputo onde consegui uma colocação para trabalhar no Conselho Municipal. Trabalho há 23 anos para o Governo da cidade. A minha sorte foi o facto de, novamente, ter sido indicado para dirigir o sector da cultura.
Penso que vou morrer a dedicar-me às actividades culturais porque não sei quando é que serei reformado.
Momentos inolvidáveis
A partir de 1976 em diante começaram a gerar-se momentos marcantes na minha relação com as actividades culturais, sobretudo porque é nessa época em que eu começo a dedicar-me com muita firmeza nas danças tradicionais. Percebi que eu devia trabalhar exclusivamente na área.
Sendo também uma actividade de manutenção física, o baile satisfaz o meu corpo. É uma ginástica.
Na minha família apenas eu é que pratico actividades artístico-culturais. É que, infelizmente, ao longo da guerra dos 16 anos, o meu irmão que seguia a Cultura também foi raptado e fuzilado pelos homens do mato. Foi uma experiência triste porque ambos formávamos uma dupla bem dedicada às danças tradicionais na família.
Invariavelmente, no contexto do Grupo de Ngalanga do Conselho Municipal, as nossas actuações têm sido realizadas na Praça da Independência e no Aeroporto Internacional de Maputo – geralmente em actividades governamentais – em recepções a diplomatas que visitam Moçambique para realizar intercâmbios sociopolíticos.
Já viajamos para vários países com os quais o Governo moçambicano – em particular o Conselho Municipal da Cidade de Maputo – coopera, a fim de exibir as nossas manifestações culturais. São exemplos desses países, a França, o Portugal e a Correia do Sul.
Eu sou o responsável pela prática cultural no Conselho Municipal. É verdade que faço outro tipo de trabalho, mas o principal é a dinamização artístico-cultural.
Há dificuldades
Sinto que na dança tradicional há muita falta de praticantes. É que alguns já reformaram, outros perderam a vida, da mesma forma que – devido à luta pela sobrevivência – há companheiros que emigraram para a África do Sul, onde trabalham nas Minas. Essas transformações sociais enfraqueceram a colectividade.
Temos uma orientação do Conselho Municipal da Cidade de Maputo no sentido de recrutarmos novo pessoal para se associar ao nosso grupo. No entanto, estamos a enfrentar dificuldades porque, agora, a maior parte das pessoas que estudaram não gosta de se dedicar à Cultura. Começo a perceber que nós, os camponeses, que viemos das zonas rurais, é que conseguirmos dominar as actividades artístico-culturais.
As pessoas perceberam que para terem um bom emprego, ou uma boa colocação no Estado, precisam de apostar mais nos estudos – o que é bom. O problema é que isso também concorre para que nas cidades as pessoas apostem pouco na prática de danças tradicionais.
Por essa razão eu gostaria que os jovens – muito em particular os da província de Inhambane, no distrito de Inharrime – tivessem muita dedicação nas áreas culturais. Estimo saber que há pessoas que aplicaram a sua vida na promoção das suas manifestações artístico-culturais, promovendo o conhecimento do seu povo no mundo.
Nós precisamos de nos unirmos, cada vez mais, em qualquer onde estivermos, para fazer a Cultura desenvolver.